As músicas chegam aos meus
ouvidos mesmo com as janelas do quarto fechadas e eu, lendo pela terceira vez o
mesmo artigo, me sinto abatida e só. Talvez, quando amanheça, nem olhe para o
céu. Que diferença haveria entre o sol e a trovoada, se dentro de mim a
sensação é de desencontro? Agora, com o artigo sob a mesa, penso em ouvir alguma
música agitada, ou quem sabe ler poemas eróticos. Fugir um pouco do meu modo
comum de viver, para me desprender das leis que obedeço há muito tempo. Estou
exausta desses livros que me acompanham nas madrugadas e nos bancos das praças,
mas mesmo fadigada não os deixo por um instante sequer. A ampulheta do meu
tempo está parada e ameaça nunca voltar a funcionar.
A cabeça já começa a doer e me pergunto por que os remédios não fazem mais
efeito... A chuva caindo lá fora, meus olhos secos aqui dentro, os pássaros
buscando um refúgio pra escaparem do frio e eu presa em meu próprio quarto, sem
ter condições de fugir do frio da minha lentidão e da minha concepção monótona
de que a satisfação é melhor alcançada quando se aprende mais sobre história e
filosofia.
Por vezes, sinto o tímido desejo de mudar minha forma de enxergar o mundo, de
sair mais, de reavivar a cor dos meus olhos baixos e semicerrados. Assim, vai
surgindo em minha mente uma agonia tão insana e um desespero tão repreendido
que até o ânimo de escrever me foge e as palavras me parecem tão escorregadias
que se torna impossível tê-las como aliadas. Realmente estou só. Acho melhor
tomar mais uns comprimidos e tentar dormir, antes que meu coração palpite mais
forte e que a sudorese invada o meu corpo. Prefiro o risco de não ter sonhos
durante o sono, do que estar acordada e acreditar viver um pesadelo, no qual as
minhas escolhas me esfaqueiam a cada segundo que se passa.
Sangue corre nas veias rubro, rápido e quente Inerente à vida alheia com alto teor fervente Retratando toda força das letras lançadas na sujeira das poças d'uma ira elucidada...
Jamais frearei a língua diante de hipóteses Nem chorarei à míngua sem batons e retoques
O insulto é um filho que carrego no ventre É a cobra que eu crio É a minha semente É o terreno baldio do qual sou residente!